Rasgar fotografias
com desgosto
ritual, meticuloso na destruição
como Antero de Quental.
Escrever, por não querer dizer,
ansioso de calar-me, de
caiar-me uma noite
iluminado luto,
canção da ponte admirável
quando eu era um rio a correr
ao teu encontro.
A realidade não dá descanso a ninguém
acordado; e muito menos ao poeta
que dorme bem desperto, a sono preso
ao sonho e para além do sonho
adensado em tumulto de mistério.
Desligar as estrofes, experimentar ignorar
com consciência: sair para poder entrar
por outra porta. Há uma infinidade de portas.
Muito poucas estão abertas.
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▪ António Barahona
(Lisboa, n. 1939)
in “Raspar o Fundo da Gaveta e Enfunar uma Gávea”, Averno, Lisboa, 2011