Vem,minha irmã

 

Vem, minha irmã, traz o cântaro de azeite.

acompanha-me! Pois não esqueceste o ritual
entre nós devotamente guardado.
Este é o sétimo verão que ouvimos, enquanto,
tirando água da fonte, conversávamos:
nesse mesmo dia o nosso noivado morreu:
vamos à fonte do prado, onde dois álamos
estão de guarda perto de um pinheiro,
buscar água com o cântaro de barro cinzento.

_
▪ Stefan George
( Alemanha 🇩🇪 )

Mudado para português por Luís Costa

 

CAFÉ NA PRAIA

O café está aberto anda,
os mortos estão lá sentados
em cadeiras acorrentadas, bebendo vinho
À nossa custa. Há algumas casas –
Retiradas do mar – a ver.
Um pedinte recolhe moedas e
atira -as aos mortos como um sacrifício.
Do bar, estendendo-se até ao mar,
há uma estreita faixa de luz
pela qual os mortos se afastam,
sobre a água. Permanecemos, ali sentados,
até o dia esfregar os olhos.

 

 

_
▪ Michael Krüger
( Alemanha 🇩🇪 )
in “ Deus escreveu demasiado”, edição do lado esquerdo,2022
Tradução de Francisco José Craveiro de Carvalho

A HIENA

A hiena ama os tanques de guerra
que ficam em pé nos desertos
porque a tripulação morreu.
Ela sabe esperar.
Ela espera até que mil e uma
tempestades de areia corroam o aço.
Então chega a sua hora.
A hiena é o animal heráldico da Matemática,
ela sabe que não pode ficar nenhum resto,
o seu deus é  o zero.

 

_
▪ Heiner Müller
(Alemanha 🇩🇪 )
Mudado para português por Luis Costa

A FELICIDADE DO MEDO

 

Para a Ana

 

Às vezes entre a noite e a manhã
Vejo os cães rodearem-te
Cães com os dentes à mostra
E tu deitas as mãos às suas patas
E ris nos seus dentes
E eu acordo a transpirar de medo
E sei que te amo

 

_
▪ Heiner Müller
(Alemanha 🇩🇪 )
in “Traumtext”, Editora Stroemfeld, 1996

*

Mudado para português por _ Luís Costa 🇵🇹  Poeta e tradutor



 

DAS GLUCK DER ANGST

Für Anna

 

Manchmal zwischen Nacht und Morgen
Seh ich Hunde dich umkreisen
Hunde mit gebleckten Zähnen
Und du greifst nach ihren Pfoten
Und du lachst in ihre Zähne
Und ich wache auf mit Angstschweiß
Und ich weiß daß ich dich liebe

 

_
▪ Heiner Müller
( Deutschland 🇩🇪 )
in “Traumtext”, Stroemfeld, 1996