A caminho ouvi um bater de asas assustadas. Foi tudo. A esse lu-
gar vai-se sozinho. É uma construção alta, totalmente escavacada,
um estrutura que oscila mas que nunca poderá desabar. O sol mi-
lenário penetra pelas fendas. Nesse jogo de luzes há uma lei da gra-
vidade ao invés: a casa parece estar assente no céu, e aquilo que cai,
cai de pernas para o ar. Nesse sítio temos de nos voltar para trás.
Nele é permitido estar de luto. Ali, atrevemo-nos a concordar com
grandes verdades, as quais quase sempre mantemos por desemba-
lar. Pensamentos profundos, meus, ali sobem à tona, ficam pendu-
rados como os crânios secos das palhoças de antepassados em al-
guma ilha minúscula da Melanésia. Um orvalho benéfico espalha-
-se à volta dos horríveis troféus. Quão suave pode ser a floresta!
__
▪ Tomas Tranströmer
(Suécia, n. 1931 – 2015)
in “50 Poemas”, Tradução de Alexandre Pastor, Relógio D’Água, Lisboa, 2012