LIMIAR

No corpo, onde tudo tem seu preço,
eu era um mendigo. Ajoelhado,

olhava, pela fechadura, não
o homem no banho, mas a chuva

a atravessar seu corpo: cordas de guitarra a
estalar sobre ombros em forma de globo.

Ele cantava, e é por isso
que eu lembro. Sua voz —

me preenchia até o osso
como um esqueleto. Até mesmo meu nome

se ajoelhava dentro de mim, pedindo
para ser poupado.

Ele cantava. É tudo que lembro.
Pois no corpo, onde tudo tem seu preço,

eu estava vivo. Eu não sabia
que havia motivo melhor.

Que certa manhã meu pai ia parar
— potro negro em tempestade —

& tentar escutar minha respiração contida
atrás da porta. Eu não sabia que o custo

de entrar numa canção — era perder
o caminho de volta.

Por isso entrei. Por isso perdi.
Perdi tudo com meus olhos

bem abertos.

 

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▪ Ocean Vuong
( Vietname 🇻🇳 )

*

Mudado para português do brasil por _ Rogério W. Galindo _ 🇧🇷