PARTO

O poema doía
porque queria nascer.

Agora
já não está cá dentro.
Sanguinolento
já me resvala
rápido-lento.
Parteira dele
dele me aparto deixo-o partir
ao sol da lua
ao ar do vento.

Agora é ele
já não sou eu.

Já não me dói. (Só me doeu)

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▪ Ana Goês
( Portugal 🇵🇹 )
in “Queria dizer palavras

CONVIDA-ME SÓ PARA JANTAR

Convida-me só para jantar

E não queiras depois fazer amor.
Convida-me só para jantar
num restaurante sossegado numa mesa de canto
e fala devagar
e fala devagar
eu quero comer uma sopa quente
não quero comer mariscos
os mariscos atravancam-me o prato
e estou cansada para os afastar
fala assim devagar
devagar
não é preciso dizeres que sou bonita
mas não me fales de economia e de política
fala assim devagar
devagar
deita-me o vinho devagar
quando o meu copo estiver vazio.
Estou convalescente
sou convalescente
não é preciso que o percebas
mas por favor não faças força em mim.
Fala, estás-me a dar de jantar
estás-me a pôr recostada à almofada
estás-me a fazer sorrir ao longe
fala assim devagar
devagar
devagar

 

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▪Ana Goês
( Portugal 🇵🇹 )
in “366 Poemas Que Falam de Amor“, 2004