assim que deus me apareceu peguei na máquina dos anjos
e comecei a escrever
certo é que sou mãe mas não uma qualquer
ando de um lado para outro com o paraíso dentro
conheço a cor intensa das mulheres que se sentam em casa
à espera que o seu corpo rebente
e penso:
agora escrevo como uma matrioska
estou sempre a deitar cá para fora mundos que fazem aumentar o universo
o Pessoa sabia-o e mudava frequentemente de ADN
estava farto de coisas visíveis como eu que nunca estou
na mesma cabine nem no mesmo laboratório de sombras
com a mão aberta à ciência
que hei de fazer se sou de dentro para fora
estou sempre grávida
repleta de objetos exóticos que se espantam de
tudo nada existir realmente
tenho o ar leve
sou uma nave
o meu corpo é uma metáfora
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▪ Maria Azenha
( Portugal 🇵🇹 )
Integra a Antologia Poética “Quem dera o sangue fosse só o da menstruação” – Volume II, Organização Debora Ribeiro 🇧🇷, Editora Urutau, Brasil/Galiza e Portugal, 2020