Onde está
mãe onde está
entre todos os leitos
da terra
a pedra o nó do vento
o azul de todas as cores
que te falam
no fogo da Noite?
o amor soluça tempestades!
há homens desmaiados!
onde está mãe
onde está
onde o vento sopra
onde o vento compreende
e sabe
que brilha nesta Terra
esta ciência
esta conta feita
que não vem de volta?
o amor é uma águia
voando assustadoramente
para além das lágrimas!
onde está
mãe onde está
a rotação do fogo
a estrela do mar-alto
os cavalos-frases com
bordados infindáveis
na hélice da Noite?
o amor é um passo ao lado
como um cão que ladra!
onde está mãe
onde está
o vapor dos barcos
que fogem das águas
no sangue incolor redistribuído
pelas casas
pelas lâmpadas pelas covas
pelas árvores
que comigo bebem
copos enlouquecidos
de
cantos telegráficos?
o amor é um automóvel
a dividir por quatro rodas!
onde está
mãe onde está
o teu filho de dedos ciclópicos
feito com os teus olhos
cheios de contornos
que eu recordo que eu
recordo
o amor é uma bruxa
a perguntar por tudo!
onde está mãe
onde está
o coração velho das fábricas
agora
transformado
em supermercados em hipermercados
em hiperhipermercados
condenados
à fealdade dos homens?
o amor tem voz fanhosa!
anda constipado.
não tem rosas no lugar adequado!
onde está mãe
onde está
o céu riscado
o outro Lado
onde andava de comboio pelo Cosmos
entre cativas margens
onde Deus fecundava as páginas?
o amor é um calendário!
uma cidade doida
com espelhos nas escadas!
onde está
mãe onde está o mar
a sua flauta mágica?
os dois cornetos de nuvens
que eu amava
que eu amava,
onde flutuam?
o amor é uma máquina de números!
um dois três !
um dois três !
uma picadora eléctrica
que faz parar o trânsito
entre Deus
e
os
Poetas!
Belos semáforos telegráficos!
olha mãe olha
mãe
eu vou acelerar vertiginosamente
estou farta de ser homem tristeza de menina
sou marianalfabeta
sou marianalfabeta
sou Poeta.
e as rosas
hoje
incomodam-me
olha mãe olha
mãe o amor
é uma grande guerra
que abre
e fecha as portas
põe luzes no Caminho
uma tragédia d’águas
olha mãe olha
mãe,
que vou acelerar vertiginosamente
fujo atrás dos figos
os mais esbeltos os mais livres
em carne e sangue vivos…
o amor é um rapaz na estrada
à espera de uma mulher
que é um violino!
olha mãe olha
há muito tempo que é domingo
e vou sozinha
intensamente livre
angélica e fantasma,
dei um pulo para a Outra margem.
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▪ Maria Azenha
( Portugal 🇵🇹 )
in “P.I.M.”, Universitária Editora, Lisboa, 1999