PARA O NELSON, QUE NUNCA LERÁ ESTE POEMA

Alto, esguio, talvez uns trinta anos,
completamente cego,
resiste à indiferença das ruas.
Agora, acompanhado por um jovem,
caminha neste mundo sombrio.

A minha voz,
saída dos escombros de uma guerra fria,
ouviu-se desolada e triste:
bom dia.

Passámos alguns segundos quietos
a ouvir o som um do outro.

Quem éramos afinal neste encontro?
Que armas trazíamos?
Quem era o que matava e o que foi morto?

-pouco mais haveria a dizer –

Ouviu-se, no fim da rua :
Adeus! Até à próxima.

Um cão – de um castanho escuro –
parecia não se importar muito.

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▪ Maria Azenha
( Portugal 🇵🇹 )
in ” A casa da memória”