NO MEIO DA NOITE

Esta página é a de um morto
numa casa envenenada pelo vento.
Corre no meio da noite
em busca do poema.

E o poema esconde-se

muito puro
no silêncio de um homem aflito.

A Deus pede
o sudário de uma estrela

na agonia
do
infinito.

 

_
▪ Maria Azenha
( Portugal 🇵🇹 )
inédito



 

NEL CUORE DELLA NOTTE

 

Questa pagina è quella di un morto
in una casa avvelenata dal vento.
Corre nel cuore della notte
in cerca della poesia.

E la poesia si nasconde

molto pura
nel silenzio di un uomo afflitto.

A Dio chiede
il sudario di una stella

nell’agonia
dell’infinito.

 

_
▪ Maria Azenha
( Portugal 🇵🇹 )
inedito

*

Mudado para italiano por _ Daniela Di Pasquale 🇮🇹 _ tem licenciatura em Letras e doutoramento em Estudos Comparatistas. Foi bolseira de pós-doutoramento durante 7 anos no Centro de Estudos Comparatistas da Universidade de Lisboa. Traduz poesia e ficção de português para italiano e o seu primeiro livro de poemas foi publicado em 2014 (Mater Babelica, Lietocolle). Actualmente trabalha na área da educação.

TRE MADRI. TRE POESIE DI SABBIA

Ho sognato che avevo tre madri.
Tutte e tre stanno sotto un albero con gli occhi in alto.
La prima è trasparente e cuce pezzi fini di un cratere
dentro il mio petto.
La seconda brilla nel deserto nelle pareti della mia stanza.
E piange fili di seta in un caverna.
La terza suona il Silenzio di un Flauto,
cantando musiche antiche,
per gli anni che non abbiamo vissuto insieme.
Tutte e tre appartengono a un paese di sabbia e stanno tutte su un’isola.
noi abbiamo visto i prigionieri che ci hanno fatto compagnia.
Uno di loro è mia Madre. L’altro, mia figlia.

 

_
▪ Maria Azenha
( Portugal 🇵🇹 )
in “C.M.”

*

Mudado para italiano por _ Daniela Di Pasquale 🇮🇹 _ tem licenciatura em Letras e doutoramento em Estudos Comparatistas. Foi bolseira de pós-doutoramento durante 7 anos no Centro de Estudos Comparatistas da Universidade de Lisboa. Traduz poesia e ficção de português para italiano e o seu primeiro livro de poemas foi publicado em 2014 (Mater Babelica, Lietocolle). Actualmente trabalha na área da educação.



TRÊS MÃES. TRÊS POEMAS DE AREIA

 

 

Sonhei que tinha três mães.
As três estão debaixo de uma árvore de olhos para cima.
A primeira é transparente e cose pedaços finos de uma cratera
dentro do meu peito.

A segunda brilha no deserto nas paredes do meu quarto.
E chora fios de seda numa caverna.

A terceira toca o Silêncio de uma Flauta,
cantando músicas antigas,
pelos anos que não vivemos juntas.

As três pertencem a um país de areia, e estão todas numa ilha.
nós vimos os prisioneiros que nos fizeram companhia.
Um deles é minha Mãe. Outro, minha filha.

 

_
▪ Maria Azenha
( Portugal 🇵🇹 )
in “C.M”

 

* Áudio: “Três Mães. Três poemas de areia” — Maria Azenha [Poema e voz]
Música – ‘Beyond’ (excertos) , Tina Turner

 

I MORTI DEL MONDO MODERNO

Ho visto Abele uccidere Caino!
Ho visto uno specchio di morti di velluto
accostati a un Muro.
Bevevano birre insieme ed erano ubriachi di Buio.
Quando parlo di questo alle persone
con parole incise su corone di spine
voltano le spalle. Non sanno di cosa io parli.
Allora ho dovuto mettere una maschera.
Con guanti chirurgici ho graffiato il vento
e i versi non gemettero al toccarli.
Né una foglia a terra per il biancore caldo delle mani.
Né uno specchio degno per scrivere oscuramente sulle braccia.
Riesco solo a urlare l’imponderabile il rally immenso dei morti.
I negozi,
— Come dirvi? —
con lo stesso manichino da vetrina
con gli stessi vestiti,
con gli stessi denti,
con gli stessi colori,
e le gambe dei bambini senza mutamento.
Non so come lo sopportano.

Là dentro il registratore di cassa del tempo
e il sangue che scorre nella roca speranza.
La padrona del negozio è appassita.
Chiede ogni momento scusa.

Uscirò nella selva, ho solo bisogno che qualcuno mi ascolti
su un ramo di angoscia.
Risolvo la maschera con i pasticci della Cina
e con la candeggina della Storia per disinfettare il mondo.

Approfitto ora di un intervallo per insultare la memoria
e passeggiare nelle ombre creatrici di uccelli.
Quasi immersa nel terrazzo, a metà pomeriggio, di un sesto piano,
prendo il sole e il suo mansueto abbraccio.
— Non si sentono macchine,
né aerei esaltati
che improvvisano sonate per topi.
Tutto è andato giù nello scarico del mondo. —

Quasi le cinque.
Sono quasi le cinque.

C’è uno specchio di morti di velluto
da qualche parte
accostato
a un Muro.

Più tardi,
i morti pensierosi e maturi
andranno al lavoro,
come di consueto.

 

_
▪ Maria Azenha
( Portugal 🇵🇹 )
in “Poesia de Protesto”

*

Mudado para italiano por _ Daniela Di Pasquale 🇮🇹 _ tem licenciatura em Letras e doutoramento em Estudos Comparatistas. Foi bolseira de pós-doutoramento durante 7 anos no Centro de Estudos Comparatistas da Universidade de Lisboa. Traduz poesia e ficção de português para italiano e o seu primeiro livro de poemas foi publicado em 2014 (Mater Babelica, Lietocolle). Actualmente trabalha na área da educação.

 

CORRE NUDA NELLA VIA

Corre nuda nella via.
– È una donna –
Consegna la pioggia
di perla
in
perla
a un diamante segreto
occulto nelle mani.

Viene con lei la notte
e la neve.
E il primo giorno della Creazione.
Se mia figlia vivrà, sarà sua.

 

_
▪ Maria Azenha
( Portugal 🇵🇹 )
in “C.M.”

*

Mudado para italiano por _ Daniela Di Pasquale _ 🇮🇹 tem licenciatura em Letras e doutoramento em Estudos Comparatistas. Foi bolseira de pós-doutoramento durante 7 anos no Centro de Estudos Comparatistas da Universidade de Lisboa. Traduz poesia e ficção de português para italiano e o seu primeiro livro de poemas foi publicado em 2014 (Mater Babelica, Lietocolle). Actualmente trabalha na área da educação.

 

CORRE NUA NA RUA

 
Corre nua na rua.
– É uma mulher –
Entrega a chuva
de pérola
em
pérola
a um diamante secreto
oculto nas mãos.

Vem com ela a Noite
e a neve.
E o primeiro dia da Criação.
Se minha filha viver, será sua.

 

_
▪ Maria Azenha
( Portugal 🇵🇹 )
in “C.M.”

 

A cidade

A ambulância atravessa a cidade
com uma pedra na boca
uma pedra com uma guerra dentro
uma pedra que atravessa o deserto do corpo
uma pedra maior que a própria cidade

uma mulher com uma cadeira de pano
numa rua qualquer
de rosto tapado pelos cabelos grisalhos
ignora quem passa

aos pés uma bagagem de pedras
ou quem sabe de armas

– não me digam para lhes contar –

morreu no deserto
crescem-lhe pedras no crânio

 

_
▪ Maria Azenha
( Portugal 🇵🇹 )
in “Livro do absurdo”



🇮🇹

 

░  LA CITTÀ

 

L’ambulanza attraversa la città
con una pietra in bocca
una pietra con una guerra dentro
una pietra che attraversa il deserto del corpo
una pietra più grande della stessa città

una donna con una sedia di stoffa
in una via qualunque
il volto coperto dai capelli ingrigiti
ignora chi passa

ai piedi una valigia di pietre
o chissà di armi

– non ditemi di raccontarvelo –

è morta nel deserto
le crescono pietre sul cranio

 

_
▪ Maria Azenha
( Portugal 🇵🇹 )
in “Livro do absurdo”

*

Mudado para italiano por _ Daniela Di Pasquale _ 🇮🇹 tem licenciatura em Letras e doutoramento em Estudos Comparatistas. Foi bolseira de pós-doutoramento durante 7 anos no Centro de Estudos Comparatistas da Universidade de Lisboa. Traduz poesia e ficção de português para italiano e o seu primeiro livro de poemas foi publicado em 2014 (Mater Babelica, Lietocolle). Actualmente trabalha na área da educação.

 

 

░ ASSURDO

Oh fiore di ansia sul mondo
— escremento della rovina —
verso che affoga di fronte al Nulla!

La poesia arde sui suoi cavalli ardui.
La disperazione terrorizza la pagina.

 

_
▪ Maria Azenha
(Portugal, n. 1945)
in “A Casa de Ler no Escuro”, Editora Urutau, São Paulo – Brasil, 2016

*

Mudado para italiano por _ Daniela Di Pasquale _ tem licenciatura em Letras e doutoramento em Estudos Comparatistas. Foi bolseira de pós-doutoramento durante 7 anos no Centro de Estudos Comparatistas da Universidade de Lisboa. Traduz poesia e ficção de português para italiano e o seu primeiro livro de poemas foi publicado em 2014 (Mater Babelica, Lietocolle). Actualmente trabalha na área da educação.



VERSÃO ORIGINAL

 

░ ABSURDO

 

Oh flor de ânsia sobre o mundo
— excremento da ruína —
verso que se afoga frente ao Nada!

O poema arde em seus cavalos árduos.
O desespero horroriza a página.

 

_
▪ Maria Azenha
(Portugal, n. 1945)
in “A Casa de Ler no Escuro”, Editora Urutau, São Paulo – Brasil, 2016

 

░ LO ZELO DELLE TENEBRE

Lui amava la donna.
Lei si impiccò nella casa della spiaggia.
La trovò da sola senza i piedi sul suolo.

La vide
Dopo
vicino alla finestra
immergersi nel silenzio della sala.

Starà
provando i rami teneri
della Primavera?
O spia dentro gli specchi
di Marzo?

Difficile immaginare questi alberi
di tenebre
senza aria alcuna!

Nei miei sogni lei dice sempre addio
cavalcando verso il mare

 

_
▪ Maria Azenha
(Portugal, n. 1945)
in “A Casa de Ler no Escuro”, Editora Urutau, São Paulo – Brasil, 2016

*

Mudado para italiano por _ Daniela Di Pasquale _ tem licenciatura em Letras e doutoramento em Estudos Comparatistas. Foi bolseira de pós-doutoramento durante 7 anos no Centro de Estudos Comparatistas da Universidade de Lisboa. Traduz poesia e ficção de português para italiano e o seu primeiro livro de poemas foi publicado em 2014 (Mater Babelica, Lietocolle). Actualmente trabalha na área da educação.



VERSÃO ORIGINAL

 

░ O ZELO DAS TREVAS

 

Ele amava a mulher.
Ela enforcou-se na casa de praia.
Encontrou-a sozinha sem os pés no solo.

Viu-a
Depois
junto à janela
mergulhar no silêncio da sala.

Será
que prova ramos tenros
da Primavera?
Ou espia para dentro dos espelhos
de Março?

Difícil imaginar estas árvores
de trevas
sem nenhum ar!

Nos meus sonhos ela está sempre a dizer adeus
cavalgando para o mar

 

_
▪ Maria Azenha
(Portugal, n. 1945)
in “A Casa de Ler no Escuro”, Editora Urutau, São Paulo – Brasil, 2016

 
 
 

░ O excesso mais perfeito

Queria um poema de respiração tensa
e sem pudor.
Com a elegância redonda das mulheres barrocas
e o avesso todo do arbusto esguio.
Um poema que Rubens invejasse, ao ver,
lá do fundo de três séculos,
o seu corpo magnífico deitado sobre um divã,
e reclinados os braços nus,
só com pulseiras tão (mas tão) preciosas,
e um anjinho de cima,
no seu pequeno nicho feito nuvem,
a resguardá-lo, doce.
Um tal poema queria.
Muito mais tudo que as gregas dignidades
de equilíbrio.
Um poema feito de excessos e dourados,
e todavia muito belo na sua pujança obscura
e mística.
Ah, como eu queria um poema diferente
da pureza do granito, e da pureza do branco,
e da transparência das coisas transparentes.
Um poema exultando na angústia,
um largo rododendro cor de sangue.
Uma alameda inteira de rododendros por onde o vento,
ao passar, parasse deslumbrado
e em desvelo. E ali ficasse, aprisionado ao cântico
das suas pulseiras tão (mas tão)
preciosas.
Nu, de redondas formas, um tal poema queria.
Uma contra-reforma do silêncio.
Música, música, música a preencher-lhe o corpo
e o cabelo entrançado de flores e de serpentes,
e uma fonte de espanto polifónico
a escorrer-lhe dos dedos.
Reclinado em divã forrado de veludo,
a sua nudez redonda e plena
faria grifos e sereias empalidecer.
E aos pobres templos, de linhas tão contidas e tão puras,
tremer de medo só da fulguração
do seu olhar. Dourado.
Música, música, música e a explosão da cor.
Espreitando lá do fundo de três séculos,
um Murillo calado, ao ver que simples eram os seus anjos
junto dos anjos nus deste poema,
cantando em conjunção com outros
astros louros
salmodias de amor e de perfeito excesso.
Gôngora empalidece, como os grifos,
agora que o contempla.
Esta contra-reforma do silêncio.
A sua mão erguida rumo ao céu, carregada
de nada—

 

_
▪ Ana Luísa Amaral
(Lisboa, n. 1956)
in “Às vezes o paraíso”, Quetzal, Lisboa, 1998



– Traduzione –

 

L’eccesso più perfetto

Vorrei una poesia dal respiro teso
e senza pudore.
Con l’eleganza rotonda delle donne barocche
e tutto il contrario di un esile arbusto.
Una poesia che Rubens invidierebbe, nel vederla,
là dal profondo di tre secoli,
il suo corpo magnifico sdraiato su un divano,
e le braccia nude adagiate,
solo con braccialetti tanto (ma tanto) preziosi,
e un angioletto in cima,
nella sua piccola nicchia fatta nube,
a proteggerlo, dolce.
Una poesia così vorrei.
Molto più tutto che le greche dignità
dell’equilibrio.
Una poesia fatta d’eccessi e dorature,
eppure splendida nella sua potenza oscura
e mistica.
Ah, come vorrei una poesia differente
dalla purezza del granito, e dalla purezza del bianco,
e dalla trasparenza delle cose trasparenti.
Una poesia che esulti nell’angustia,
un grande rododendro color del sangue.
Un intero bosco di rododendri dove il vento,
passando, sostasse incantato
e premuroso. E lì restasse, catturato dal canto
dei suoi braccialetti tanto (ma tanto)
preziosi.
Nuda, dalle forme rotonde, una poesia così vorrei.
Una controriforma del silenzio.
Musica, musica, musica a colmarle il corpo
e i capelli intrecciati con fiori e serpenti,
e una fonte di stupore polifonico
a scivolarle tra le dita.
Adagiata sul divano foderato di velluto,
la sua nudità rotonda e piena
farebbe impallidire grifoni e sirene.
E i poveri templi, dalle linee tanto contenute e pure,
tremare di paura alla sola folgorazione
del suo sguardo. Dorato.
Musica, musica, musica e l’esplosione del colore.
Scrutando là dal fondo di tre secoli,
un muto Murillo, al veder che erano semplici i suoi angeli
insieme agli angeli nudi di questa poesia,
cantando in coro con altri
astri biondi
salmodie d’amore e di perfetto eccesso.
Gôngora impallidisce, come i grifoni,
ora che lo contempla.
Questa controriforma del silenzio.
E la sua mano tesa verso il cielo, carica
di nulla–

_
▪ Ana Luísa Amaral
(Lisbona, n. 1956)
in “Talvolta il Paradiso”, Quetzal, Lisbona, 1998
Traduzione di Chiara De Luca (Escritora, Traductora y Ensayista)

 

░ As nuvens apressam-se

Terça-feira. As nuvens apressam-se.
A minha mãe teria agora cem anos.
O meu pai um pouco mais velho.
Os avós o dobro das idades.
Esses não os conheci. Os muros da terra
já os devem ter engolido.
O tempo sussurra os seus nomes debaixo das árvores.

Serenamente ouço o rumor das aves
à entrada do paraíso.

Somos apanhados em todos os lugares.

 

_
▪ Maria Azenha
(Coimbra, n. 1945)
Inédito publicado com autorização prévia da autora



VERSIONE ITALIANO

░ Le nuvole si affrettano

 

Martedì. Le nuvole si affrettano.
Mia madre avrebbe ora cent’anni.
Mio padre un po’ più vecchio.
I nonni il doppio dell’età.
Non li ho conosciuti. I muri della terra
li avranno già ingoiati.
Il tempo sussurra i loro nomi sotto gli alberi.

Serenamente sento il mormorio degli uccelli
all’ingresso del paradiso.

Siamo presi in tutti i luoghi.

 

_
▪ Maria Azenha
(Coimbra, n. 1945)
Inédito publicado com autorização prévia da autora

Mudado para italiano por – Daniela Di Pasquale, tem licenciatura em Letras e doutoramento em Estudos Comparatistas. Foi bolseira de pós-doutoramento durante 7 anos no Centro de Estudos Comparatistas da Universidade de Lisboa. Traduz poesia e ficção de português para italiano e o seu primeiro livro de poemas foi publicado em 2014 (Mater Babelica, Lietocolle). Actualmente trabalha na área da educação.